60 DIAS

Até os primeiros cem dias da partida de um ente querido, a reformulação e o processo de toda nossa vida, o quem somos, aquilo que nos acompanha, o que ficou dos planos, os ofícios da matéria, as não-importantes coisas, os respiros entre loucura e sanidade .. quem você conhece pelo caminho, e quem não te abandona por esse mesmo caminho, passam como um pulsar todos os dias, de três a cem vezes.
As responsabilidades que assumimos ao ato sublime de amar alguém, de incluir outro ser humano, dotado de suas experiências e seu próprio tempo - à nossa vida e nosso próprio tempo. As responsabilidades que ficam e a honra que é, ainda após o fim, sentir-me parte e conectada e herdeira de tudo o que na partilha do tempo, aprendemos juntos.

Não há fins de fato. Há recomeços, dentro de um eterno aprender. Cada um destes sessenta dias foram um mergulho profundo; e deixaram marcas em minha alma e curaram outras, restando apenas as cicatrizes das batalhas, sabendo que nem de longe perdemos essa guerra. Seguimos. Apenas sabendo de tudo o que se é.

Reconfiguración a partir del centro. Equilibrio. 

Há muito o que dizer e por isso muitas vezes guardar o silêncio termina por ser a minha melhor opção. Penso nos que me conhecem agora, e enxergam essa parte de mim, da minha vida.
Penso nos que me conheceram antes, que compartilhavam a vida com a pessoa que eu era antes.

Dentre muitas opções, hoje o diagnóstico é transtorno de estresse pós traumático, mas aí no meio de tudo isso, há dois meses atrás a capoeira me chamou. E me permitiu adentrar. Mesmo com a fratura do cóccix e o menisco do joelho direito de aparentemente oitenta anos. Mesmo com minhas crenças limitantes mentais. Mesmo com o luto, e com tudo aquilo que paralizava o meu corpo. 

E eu andei pela primeira vez de jetski, e essa sensação de liberdade, é o que eu desejo que o meu marido esteja experimentando. Me emociona como o mar está sempre ali, como sempre me acolhe, e me coloca em seus braços. Ser filha das águas, doces e salgadas, tem seus privilégios.

Certamente há um porque em não lembrarmos de nossa própria morte.
Ou pelo menos, não da última.
Certamente esse porquê está intergado com o que levamos e o que não levamos entre uma esfera dimensional de mundo, e outra.
Lembro que nenhuma agulha ou medicamento adentrou o corpo de meu companheiro sem que ele soubesse ou autorizasse, e quando essa permissividade esteve em minhãos de forma figurada e literal - pois eu assinei muitos papéis e autorizações nos dois hospitais - na ficha médica; ainda assim o fiz, preservando os métodos menos invasivos, seus quereres, e as mínimas intervenções possíveis.

Por inteligência, opção e escolha, nunca deixamos de administrar florais de bach, soundhealing, cannabidiol, respirações, banho de sol, e conversas profundas. Assim como caminhadas possíveis e depois passinhos até a cadeira de rodas. Esse tipo de força, até então eu não conhecia. A força do querer caminhar, do querer viver. Do saber o que está acontecendo. De sentir em seu corpo. Um corpo tão amado, tão em células perfeitas criado. Passar a acolher com inteirireza sua humanidade, é a forma mais divinal de dizer: obrigada por esta vida, estou pronto para a próxima.



Que eu possa em meu lugar de testemunha de profundos aprenderes ser digna e ser parte, ser plantadeira de semente boa. 


Que eu possa aprender a soltar, a não controlar tudo, a não sofrer com aquilo que não posso resolver ou negociar.


Que estes registros possam iluminar a mim, e a todos os cantos onde estas palavras ressoarem.
Que saibamos o melhor caminhar por esta terra.



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A cultura galáctica vem em paz.

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