CHORONÍ PELA SEGUNDA VEZ
Se aproximava a semana santa, ano gregoriano 2015, e como meus hábitos eram muito mais próximos dos ensinamentos budistas que dos católicos, nesse momento da minha vida, decidi aproveitar os dias livres na faculdade e fazer novamente o percurso Mérida-Aragua via terrestre, com mochila nas costas e muita fé, do jeitinho que a gente goxta. Não vou exigir de mim mesma recordar o nome da pousada, visto que fazem no mínimo uns quatro anos, desde que fiz essa viagem. Mas alguns registros valem a pena compartilhar:
Essa era a varandinha do quarto da pousada.
Na segunda vez visitando Choroní, optei por uma hospedagem numa categoria com café da manhã incluso. Nada muito além em preços, mas sim em conforto.
Algo eu já estava aprendendo na faculdade de hotelaria rs
Para uma menina de vinte anos que vivia pelos Andes se achando a própria dora aventureira com sua mochila e suas histórias, acampando e sempre passando frio, essa viagem sem planejar foi uma das primeiras que em me dei o carinho de estar comigo.
Na noite anterior o clima em Mérida era frio, e meu corpo ainda sentia a altitude de haver visitado Los Nevados naquela mesma semana.
Como quem não tem tempo a perder, traço um roteiro simples, telefono para os terminais rodoviários para verificar se todas as frotas de ônibus que eu precisaria pegar estavam funcionando normalmente, e embarco, às 6h da manhã seguinte.
Choroni pertence ao estado Aragua, é uma localidade costeira, turística e visitada durante todo o ano. Praias de infinitos tons e belezas desaguam ali.
Ao acordar, a vista da varanda é acolhedora e lembro escutar gentis camareiras já movimentando o café da manhã. Que como todo desayuno venezolano, é composto de duas arepas, queijo branco, dependendo do estado - feijão preto - ovos mexidos, café, e suco de laranja.
Para uma menina de vinte anos que vivia pelos Andes se achando a própria dora aventureira com sua mochila e suas histórias, acampando e sempre passando frio, essa viagem sem planejar foi uma das primeiras que em me dei o carinho de estar comigo.
Na noite anterior o clima em Mérida era frio, e meu corpo ainda sentia a altitude de haver visitado Los Nevados naquela mesma semana.
Como quem não tem tempo a perder, traço um roteiro simples, telefono para os terminais rodoviários para verificar se todas as frotas de ônibus que eu precisaria pegar estavam funcionando normalmente, e embarco, às 6h da manhã seguinte.
Choroni pertence ao estado Aragua, é uma localidade costeira, turística e visitada durante todo o ano. Praias de infinitos tons e belezas desaguam ali.
Ao acordar, a vista da varanda é acolhedora e lembro escutar gentis camareiras já movimentando o café da manhã. Que como todo desayuno venezolano, é composto de duas arepas, queijo branco, dependendo do estado - feijão preto - ovos mexidos, café, e suco de laranja.
Viajava com um amigo da Finlandia, e apesar de nossa forma de ver a vida ser bem diferente, compartimos muitos momentos marcantes observando como os dias podem passar de forma mágica quando não estamos imersos dentro de um ritmo de vida que nos objetifica e transforma em máquinas. E quando aproveitamos lugares que mais parecem o "quintal de casa".
Enquanto esperávamos o café da manhã, eu me perguntava como seria aquele mar.
Eu, que nasci em Niterói, e que a vida inteira vivi no litoral, nadando desde os seis anos em águas doces e salgadas, tinha dúvidas se o que eu sentia era medo daquele mar desconhecido, ou respeito, a todas as energias que formavam a agrégora ali.
A costa norte da América do Sul guarda seus segredos. Os povos originários caribes, caraíbas ou karibs (do tupi Kara' ib; sábio, inteligente) são povos indígenas das Pequenas Antilhas, que deram o nome ao mar do Caribe.
Acredita-se que os caraíbas tenham deixado as florestas tropicais do Orinoco, na Venezuela, para se estabelecer após as primeiras invasões de suas terras, no Caribe.
Chuao, Tuja y Cepe, são as ilhas que norteiam e povoam, minoritariamente, o porto. A cultura latino americana, indígena, é presente, enraizada e se firma. Se impõe.
Ao tanto que te afaga e acolhe, te ensina: como vivem os que vivem aqui, quem foram seus ancestrais, de onde vieram seus colonizadores, quais são os sabores, os temperos, quais os ritmos, como vivir la pura vida!!
Saindo da pousada a caminhada até a areia não dura mais do que dez minutos e me impressiona a musicalidade do ambiente. Ao chegar na praia, registro essa fotografia com a minha cyber-shot última geração do momento rs
Gosto muito dessa foto aqui também. Os brincos são da Plaza Las Heroínas (já citada anteriormente), e confesso que uma das vantagens das minhas feições (quando combinada com esses brincos) é que ninguém nunca percebia que eu era estrangeira. Não na Venezuela. Aragua tem em sua cultura uma melanina incrível, e hoje percebo que o sentido de pertencimento é o que fez essa experiência ser tão enriquecedora: ser tratada como local, como latina.

No Brasil a gente não entende isso. Não se considera latino. Não percebe toda a cultura e toda a herança presente em nosso sangue. Por ser um Brasil tão grande e tão rico em si, não entendemos toda a informação que nos é quase que "ocultada", e que não é ensinada nas escolas.
Quando falamos em linguagem, nas diferenças do castellano para a língua portuguesa; quando entemos a união dos povos latinoamericanos contra um sistema ilusório do "ter" e não do ser; quando nos percebemos herdeiros e representantes e nos apropriamos de tudo isso de fato, a única sensação que lembro sentir era de: uau, eu preciso mesmo explicar isso para as pessoas.
Falar sobre identidade latina e porque a gente se sente tão distante dela, é um caminho longo de diálogos e desconstruções. A minha reconexão com a minha latinidade se deu inicialmente aos nove anos, quando de maneira bem espontânea comecei a me interessar profundamente por fonemas, dialetos, transcritos, dicionários, gramáticas, e tudo que envolve ser uma criança bilíngue. Quando aos oito anos eu comecei a balbucear um princípio de castellano em casa, minha mãe viu que a coisa seria mais diferente do que ela pensava.
Ao descobrir que "grandes sucessos da música brasileira" eram na realidade traduções, como sucessos do Capital Inicial por exemplo, percebi também e quase que simultaneamente que cada um de nós, independente do idioma (ou se a conolização se deu por portugueses ou espanhóis) sofreu uma colonização injusta, ridícula, irresponsável, predatória, que deixou sequelas sociais, econômicas, e de crenças limitantes por onde passou - e compartilhamos também as sequelas disso de maneira muito louca ao seguir ensinando nas escolas que alguém "Descobriu as Americas". A história tá sendo mal contada e não é de hoje. Talvez seja essa umas das razões que tem sido tão importante voltar a escrever.
“Não há nada o que a América Latina unida não possa conseguir.” Essas foram as palavras do ex-presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, em uma de suas visitas ao Chile. O presidente à época, tinha como proposta visitar diversos países da América Latina, e tendo passado pelo Brasil, tentava desfazer a imagem que, há anos os latinos têm dos EUA e amenizar as dificuldades e as ilusões que fazemos dos "países desenvolvidos". É de longa data a adoração dos habitantes latinos pelos Estados Unidos, ou pelo continente Europeu, em todos os aspectos. Tal idolatria nos faz esquecer tudo o que se perdeu e todo que foi colocado a "prêmio" por um desenvolvimento impositivo e exploratório desses países. Tal idolatria nos faz esquecer daquilo que está muito mais perto de nós.
Brasileiros, em sua maioria, sofrem grande influência do pensamento e da cultura norte-americana e europeia, dado todo o movimento do capitalismo e das indústrias. Temos presente em nossas vidas e existência, de forma enraizada, coisas quase tal qual a nossa própria. O mesmo não ocorre com a cultura latina. Não na mesma proporção. As proximidades geográficas e linguísticas, que deveriam ser aliadas, são esquecidas. O Brasil recebe, hoje, de uma América Latina, composta por tantos países, muitíssimo pouco de tudo que estes produzem, principalmente em termos culturais. São filmes, músicas, novelas, bailes, ritmos, comidas típicas e formas de se alimentar, que sequer, tomamos conhecimento da existência.
“Não há nada o que a América Latina unida não possa conseguir.” Essas foram as palavras do ex-presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, em uma de suas visitas ao Chile. O presidente à época, tinha como proposta visitar diversos países da América Latina, e tendo passado pelo Brasil, tentava desfazer a imagem que, há anos os latinos têm dos EUA e amenizar as dificuldades e as ilusões que fazemos dos "países desenvolvidos". É de longa data a adoração dos habitantes latinos pelos Estados Unidos, ou pelo continente Europeu, em todos os aspectos. Tal idolatria nos faz esquecer tudo o que se perdeu e todo que foi colocado a "prêmio" por um desenvolvimento impositivo e exploratório desses países. Tal idolatria nos faz esquecer daquilo que está muito mais perto de nós.
Brasileiros, em sua maioria, sofrem grande influência do pensamento e da cultura norte-americana e europeia, dado todo o movimento do capitalismo e das indústrias. Temos presente em nossas vidas e existência, de forma enraizada, coisas quase tal qual a nossa própria. O mesmo não ocorre com a cultura latina. Não na mesma proporção. As proximidades geográficas e linguísticas, que deveriam ser aliadas, são esquecidas. O Brasil recebe, hoje, de uma América Latina, composta por tantos países, muitíssimo pouco de tudo que estes produzem, principalmente em termos culturais. São filmes, músicas, novelas, bailes, ritmos, comidas típicas e formas de se alimentar, que sequer, tomamos conhecimento da existência.
Quando me dei conta disso, numa linha cronológica, me dei conta de algumas coisas que nunca havia pensado antes: foi como um download instantâneo de uma compreensão mais ampla da nossa condição enquanto ser humano, da origem do nosso povo, dos desafios que enfrentamos, de todas as formas de segregação e do nosso lugar no mundo. Tive uma epifania, e permita-me exagerar, sobre quem somos e de onde viemos enquanto povo. Quem já conversou comigo, e sentiu o "contar é reviver", percebeu certamente esse "download" de qual eu estou falando.
A vista da praia principal era deslumbrante, e parecia que eu estava naquele filme A Lagoa Azul, ou sei lá, no Náufrago rs
A areia da praia era média, nem fina demais, nem cheia de pedrinhas, era uma mistura. Perfeita. A água tinha várias tonalidades diferentes, e a temperatura é bem quente em relação as praias do Rio de Janeiro. Os botes que levavam para as outras ilhas saem a cada hora do porto com colete de segurança e guias locais. Próximo da hora do almoço eu recolhia meus pertences e seguia para a pousada. E assim se passavam os dias. Em reflexões e aprendizados que não dá nem pra contar.

Um banho quente e uma excelente noite de sono antecediam os próximos quinze dias sem internet, sentindo a semana santa mais em paz da minha vida. Acordando com o dia, andando de pé descalço, bailando salsa antes mesmo do almoço, comendo peixe e "patacón" a Bs3.000 e pedindo permissão ao mar cálido para ali habitar e energizar, como quem sabe o privilégio que tem em poder conectar com essa cultura e com essas pessoas.
Mesmo ainda estando ali e tendo tanto que descobrir, bem no fundo já dava uma certa tristeza, porque na verdade meu eu de vinte anos sabia que não voltaria ali durante uma vida inteira, mas que esses ensinamentos perdurariam por muito mais vidas.
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